22 de julho de 2011


Triste autocensura

Forçar cartões amarelos para não jogar esta ou aquela partida, acordado ou não com diretoria e técnico, é comum. Não seja ingênuo. Ocorre sempre no futebol. A comprovação do ato, essa sim, é sempre difícil. E vista com receios. Mas Thiago Neves resolviu abrir o verbo. Falou. Surpreendeu a todos. Ele e Ronaldinho combinaram entre si e, sim, forçaram os terceiros cartões amarelos que lhes permitiria a ausência da partida seguinte, contra o Ceará, e a participação contra Santos, Grêmio e Cruzeiro. Declaração louvável, recheada de sinceridade, algo raríssimo nos dias em que jogadores e cartolas, personagens bons ou ruins, são doutrinados por assessores e pela ditadura da boa imagem, do bom mocismo.

Thiago Neves, então, foi criticado. Mas não só pela atitude de forçar o cartão, que, diga-se, só interessa ao Flamengo. Mas por ter declarado a intenção. Por ter concedido uma entrevista fora dos padrões de que "o importante são os três pontos" e "vamos tentar buscar a vitória". Não é raro ouvir repórter deixar entrevista coletiva e afirmar que não aproveitará uma linha sequer. Lugar comum, a mesma linguagem boleira de sempre, sem sobressaltos ou polêmicas. Então, parte da imprensa depara-se com um Thiago Neves inspirado. E qual a atitude? Condena as declarações. Não a atitude, mas as palavras. Está errado por sincero, por suscitar polêmica. Está lá na capa de um periódico, literalmente. "Cala a boca, Thiago Neves!".

O torcedor, então, deve ser privado das declarações sinceras por conta de uma autocensura da imprensa. Thiago Neves deveria dizer que não forçou cartão, foi um simples acidente. Ele e Ronaldinho sem se falaram no vestiário. Tudo por trás da cortina. Diante de reações como essa, com o camisa 7 rubro-negro, clubes sentem-se ainda mais à vontade para tolhir qualquer possibilidade de imagem negativa para o clube. Corta-se, desde a base, o direito de pensar do jogador, a possibilidade de se expressar por si só. Diga isso, garoto. Fale aquilo. Omita essa parte. Evite polêmica, pode gerar publicidade ruim. Mas, ainda que cada vez mais raros, personagens como Thiago Neves aparecem. Um caso aqui, outro ali. Craques como Ronaldinho são raros. Jogadores de expressões comedidas, como o próprio R10, são mais do que comuns. Thiago Neves confrontou o óbvio e se expôs, com naturalidade. E foi repreendido até pela imprensa. Levou bordoada para, digamos, mais de metro. Triste autocensura.

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