15 de julho de 2011


O desrespeito boleiro

O garoto clica no site e vê seu ídolo estampado com a camisa do clube. Anseia por sua estreia. Conta nos dedos. Provoca os amigos no colégio, revê os melhores lances no Youtube. Pesquisa com afinco a média de gols do craque em seu último clube e fica animado. Falta tão pouco. Rapidamente, ele liga para o pai. Pede para comprar o ingresso para a estreia do craque. Curiosamente, será contra o seu ex-clube. Gosto mais especial. Vai ser bacana.

Ele, então, se senta em frente à tv e liga o video game. Já transfere o craque para o seu time do coração. No mundo virtual, não cansa de ver a cena que será realidade em breve. Gols de todas as maneiras. De cabeça. De costas. De barriga. De perna esquerda. De perna direita. Ele ouve a porta se abrir. Lá está o pai, sorridente, com o ingresso tremulando na mão. Ele abandona a alegria virtual e admira o pedaço de plástico que lhe dará, no dia seguinte, a senha para ver seu craque em ação. Falta muito pouco.

No dia seguinte ele acorda. Sai cantando pela casa o nome do seu novo ídolo. Chegou o dia. Após o almoço, ele está devidamente trajado. A camisa, novíssima, é presente do pai e tem o número e o nome do jogador às costas. Pela rua, o garoto imagina a jogada que resultará no gol e chuta a latinha na rua para a baliza imaginária, no meio-fio. Então, ele entra no estádio. A expectativa aumenta. O nome do ídolo aparece no telão. A torcida grita mais alto. Ele entra em campo. Emocionado, o garoto urra de alegria.

A bola rola, o time vai bem e no primeiro instante o ídolo recebe a bola na área. Com a categoria que lhe é característica, dribla o goleiro e toca de maneira suave para o gol. Golaço. O garoto se prepara para vibrar, começa a abraçar o pai, mas para. Lá está seu ídolo no gramado, inerte. É abraçado pelos companheiros, mas não mostra vibração. Apenas caminha em direção ao círculo central para a saída. "Por quê?", pergunta o garoto. "Ele diz que é respeito ao ex-clube dele", responde, com pesar, o pai. Chateado, o garoto não se levanta mais do assento da arquibancada. Quer, no íntimo, ir embora. Sentiu-se desrespeitado. Ele e todos os outros torcedores que ali estavam. Tanta expectativa e...nenhuma comemoração. "Por respeito!", pragueja o garoto.

É o retrato do que fazem vários craques no futebol atualmente. Adriano, revelado pelo Flamengo, fez gol contra o São Paulo, pelo qual já jogou. E não comemorou. Fred, do Fluminense, repetiu o gesto contra o Cruzeiro após três gols. Alex, agora no Corinthians, garantiu que não comemoraria gols contra o Internacional, seu ex-clube. Para a alegria da bola, Alex não marcou. Em um nome de um vazio respeito, o jogador se agarra à hipocrisia. Desrespeito boleiro.

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