13 de dezembro de 2011


Na latinha, a tal geração de 81 do Flamengo

Em plena era digital, recheada de smartphones e redes sociais, por duas horas o rádio tomou para si o velho papel de protagonista entre os veículos de comunicação. Colados à velha latinha, milhares de rubro-negros e tantos outros torcedores de outros times se renderam de novo. Tudo graças à tal geração de 81 do Flamengo. Quem a acompanhou de perto não deixou de se emocionar. Relembrava o que fazia no momento da transmissão, como viveu cada gol rubro-negro ao longo dos 45 minutos iniciais. Os que nem chegaram perto de viver a época, se imaginaram quietinhos, ali no silêncio da madrugada, torcendo para que os ingleses não mais ameaçassem o título rubro-negro. Coisas da tal geração de 81 do Flamengo.

Em meio ao túnel do tempo proporcionado pelas ondas da Rádio Globo exatos trinta anos depois, a tal geração de 81 do Flamengo pulsou mais viva do que nunca. Invadiu redes sociais com a mesma habilidade com que Zico lançou Nunes para marcar o gol rubro-negro em Tóquio. Tomou os bares da esquina como a paixão que invadira as ruas do Rio de Janeiro naquele 13 de dezembro de 1981. Fez muita gente bater no peito e ter orgulho de ser rubro-negro e campeão do mundo. Ainda encolhidos naquele silêncio da madrugada, os amantes do futebol e do rádio prestavam atenção em cada palavra empostada com a tradicional elegância de Jorge Curi. Sentiram o frio e riram ao ouvir o locutor informar que a temperatura era tão baixa em Tóquio que até as pernas de Adílio estavam quase brancas. Tudo graças à tal geração do Flamengo de 81.

De novo foi tempo em que os relógios Mondaine eram os melhores presentes no Natal. Época em que o Ponto Frio era Bonzão e cobria qualquer oferta da concorrência. Tempos do baile rubro-negro. Pois quase sem fôlego e emocionado, Jorge Curi relatava seu sofrimento ao ter de ceder o microfone para o companheiro Waldir Amaral na segunda etapa. Parecia, mesmo, não querer se despedir novamente, ainda mais após reviver momento tão mágico. Mas, resignado, admitiu que não gostaria de voltar à locução em uma possível prorrogação daquele jogo, à altura já 3 a 0 a favor do time rubro-negro, pois preferia assistir mesmo ao Flamengo campeão do mundo. O hino rubro-negro tocava ao fundo e, no intervalo, Zico, Lico e companhia não pregaram respeito ao Liverpool. Queriam mais. Faltavam ainda 45 minutos de deleite para os torcedores que estavam no Brasil. Ah, a tal geração do Flamengo de 81...

E a bola voltou a rolar na Tóquio de 1981 e no Brasil de 2011. A madrugada continuava, o coração rubro-negro acelerava e o título estava cada vez mais próximo. Waldir Amaral assumiu o microfone e tocou a empreitada. Rui Porto considerou a fatura liquidada, mas Kleber Leite, 14 anos antes de ser eleito presidente do clube, empunhou o microfone da Rádio Globo no gramado de Tóquio e condenou uma possível acomodação rubro-negra: "Tem trivelinha demais. Vão acabar torcendo o tornozelo desse jeito!". Puro deleite. Era a tal geração do Flamengo de 81. De pé em pé, com os ingleses na roda, o Flamengo, 30 anos depois, voltou a abraçar o mundo através das ondas de rádio. E Zico, defenestrado da Gávea e mandado de volta ao museu em 2010, ergueu o trofeu e orgulho rubro-negro como nunca antes na História em Tóquio.

No microfone da Rádio Globo, com o hino rubro-negro ao fundo, declarações de que a alegria era pelo clube, a euforia era por participar de momento tão importante. Nada para si. Tudo para o clube. As badaladas dos relógios Mondaine, então, avisaram que era hora de partir. Jorge Curi e Waldir Amaral ficaram em silêncio. Kleber Leite desligou o microfone. Três décadas depois, o Flamengo tornou-se o que é graças a Raul; Leandro, Mozer, Marinho e Júnior; Andrade, Adílio e Zico; Tita, Nunes e Lico. Uma geração da qual a politicagem da Gávea já teve a ousadia de dizer que o clube precisa se libertar. Nunca, mesmo, se libertará. O que se ouviu 30 anos depois nas ondas da Rádio Globo foi história. Em duas mágicas horas, muitos voltaram no tempo. E tantos outros que não viveram aquele 13 de dezembro de 1981 entenderam o porquê de tanta reverência. A quem? À tal geração de 81 do Flamengo.

5 de dezembro de 2011


Um campeão com alma

A taça do Campeonato Brasileiro repousa em local justo. Não há como tirar os méritos deste Corinthians, campeão pela quinta vez em sua história. Um penta justo. Um penta digno. Mas, acima de tudo, um penta com alma. Porque só mesmo o Vasco, segundo colocado, para rivalizar com tamanha dignidade e entrega dos corintianos durante toda a competição. O time é notoriamente limitado na defesa, tinha em Tite um técnico para lá de pragmático. Mas encarnou como poucos encarnaram o espírito corintiano. Por isso, o título veio com a cara da turma do Parque São Jorge. Suado, sofrido, em um empate a duras penas com o maior rival. Doce sabor.

Bobagem creditar a taça ao Timão a fatos extracampo, como a influência sobre arbitragens e o sassarico desenfreado de Andrés Sanches pelos corredores poderosos do futebol brasileiro. O Corinthians de 2011 foi tão prejudicado e beneficiado como qualquer outra equipe da competição. Historicamente, times com alma surgem depois de pancadas avassaladoras. O Vasco ressurgiu depois de um início de ano deprimente, de fazer envergonhar qualquer um. O Corinthians não foi diferente. Logo após a eliminação diante do modesto Tolima ainda na primeira fase da Libertadores, o time do povo foi encarnado por uma alva vencedora. Ronaldo deu adeus ao futebol, Roberto Carlos deixou o Brasil e foi abraçado ao seu povo que o Corinthians provaria mais uma vez razão de tamanha devoção Brasil afora.

Pois o time de Tite virou jogos improváveis, perdeu na conta do chá outros incríveis, mas nunca deixou de dar um carrinho na sombra. Raríssimo ter acompanhado um gol corintiano em que o time inteiro não explodisse com o alívio de quem dava mais um passo rumo ao caminho que curaria as feridas da eliminação precoce em sua maior cobiça no início do ano. Revigorado, com a alma purificada pela tradicional luta da Fiel, o Corinthians foi o campeão do povo. Foi o Timão. E já lá de cima, doutor Sócrates deve ter ficado emocionado ao observar inúmeros punhos cerrados e erguidos em sua homenagem. Era um domingo. O Corinthians foi campeão. Foi o time do povo. Mas foi, acima de tudo, um campeão com alma.