26 de junho de 2014


Não ignorem Suárez

Não há dúvidas de que Luis Suárez merecia ser punido pela mordida em Chiellini. Mas em um futebol cada vez mais repleto de enfadonhos mapas de calor e inúmeras e frias estatísticas, a história do atacante nos passa bem diante dos olhos e parece ser ignorada. O uruguaio tem um problema. E precisa diagnosticá-lo, amenizá-lo. Do contrário, Suárez voltará a morder. Voltará a cumprir penas. E ficará preso em si mesmo, num círculo vicioso como se fosse um animal encarcerado.  

Não, Suárez não é um animal, embora sua atitude em campo - morder um adversário - seja dotada de instintos primitivos. Suárez, de certa forma, os carrega para dentro de campo. E certamente há um gatilho em seu cérebro que o faz confundir gana e provocação com agressão. Um instinto quase primário do ser humano. Quem, afinal, nunca viu um bebê irritadiço com a mãe mordê-la no ombro ou na mão? Suárez, certamente, não morde de maneira premeditada. Não faz por desejar. Há um problema. Quase uma disfunção que o leva a escolher a mordida em vez de um soco e uma cotovelada ao ser instigado, atacado. A justificativa pode estar no fato de ter crescido em bairros pobres e violentos de Montevidéu. Em um episódio marcante de sua vida. Só ele mesmo conseguiria achá-la.

Na eterna mania de escolha entre heróis e vilões, o uruguaio viveu os dois lados. Desde 2010, ao defender de forma passional, com as mãos, a bola que decretaria a eliminação uruguaia diante de Gana em Joanesburgo. Foi aos prantos com erro e, com a bola na trave de Asamoah Gyan, deu pulos de alegria. É intenso. Foi bestial ao se recuperar de uma lesão em um mês e garantir com dois gols, cheios de fúria, sobre a Inglaterra a sobrevida uruguaia. Foi besta ao morder Chiellini e tirar grande parte da confiança do próprio país na nova Copa no Brasil. Foi punido duramente. Até além da conta, aquém da função de mostrá-lo o limite existente para tudo. Até para as pelejas nas canchas do fútbol. 

A dura sanção imposta pela Fifa, de nove jogos e quatro meses ausente dos gramados, é para lá de severa. E, no fundo, não resolve o problema. Apenas dá justificativa a uma enfurecida parte das opiniões pública e especializada que elegem Suárez como o vilão que merece ser punido. Castigado. Adjetivado. Mau-caráter. Marginal. Oras, menos. Ao cravar os dentes no ombro de um adversário pela terceira vez, agora em plena Copa do Mundo, o atacante, num rompante, agrediu a si mesmo. Arranhou a imagem. Mostrou sua fragilidade. E pede ajuda, diante de todos. Que Suárez não seja, de novo, ignorado. 

Foto: Fifa.com

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